Não brinque em serviço

Respondo a algumas questões que foram levantadas por leitores. Desde logo, estabeleço uma diferença fundamental no tratamento de assuntos de linguagem: falar ou escrever  em tom coloquial é uma coisa; enfrentar vestibulares e outros concursos públicos é outra. Nestes, geralmente se pergunta o que a maioria não sabe e por isso se esperam as respostas  de acordo com as mais rígidas regras gramaticais.

Eu e mim

Como me ensinou a velha professora, “mim não faz nada”.  Assim, o correto é dizer: Isto é para eu resolver. Não saia sem eu mandar. O caso é para eu pensar.

Não havendo verbo depois, usa-se mim: Isto é para mim. Não saia sem mim. Nada existe entre mim e você.

Assistir, preferir, querer

No sentido de estar presente, o verbo assistir pede a preposição a: Assistimos a uma bela Copa. Convidado a assistir aos ensaios, assisti a eles com prazer.

No sentido de prestar socorro, dispensa o a: O médico assiste o doente.

Quem prefere, prefere uma coisa a outra: Muitos preferem ler a escrever. É da linguagem coloquial o emprego de mais e (do) que com este verbo, em frases como:

Prefiro mais banana do que laranja. Para um concurso, a forma aceitável será apenas

Prefiro banana a laranja. Observe:  É preferível vergar a quebrar.

Querer tem dois sentidos: desejar e amar. Daí a enorme diferença de intenção entre Receba um forte abraço do amigo que muito a/lhe quer… Entendeu ou boiou?

Ao encontro; de encontro

Imagine as cenasO carro foi de encontro ao poste. A filha correu ao encontro do pai. Ir de encontro = colidir, bater contra; ir ao encontro = aproximar-se pacificamente.

Daí a diferença: Suas ideias vão de encontro com as minhas, ou seja, dão trombada, opõem-se. Sua posição vem ao encontro da nossa: há concordância, coincide. Portanto, cuidado: ir de encontro indica oposição, resistência, e não anuência.

Onde, aonde, donde

Emprega-se onde com verbos que indicam situações de repouso, imobilidade: Onde me espetam fico. Morava na casa onde nasceu. Aonde se prende a situações de movimento: Você vai aonde?  Aonde chegará a sua ambição?

Donde ou de onde indica origem. Na oração do Credo está: … donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.  Outro exemplo: De onde vêm aquelas pessoas não conheço ninguém.

Observe-se que a distinção entre onde e aonde  só se estabeleceu mais recentemente

no português, assim como se abandonou a forma ainda hoje  popular adonde.  Camões (1524-1580) escreveu num soneto célebre: Se lá no assento etéreo (=céu) onde subiste… Como subir é verbo de movimento, hoje o esperável seria aonde subiste.