RUMO À CORREÇÃO DOS GRANDES ERROS

Na atualidade, ninguém pode se esquivar da influência dos acontecimentos
mundiais nem das grandes preocupações que pesam sobre a
humanidade. A tal ponto isso acontece, que sempre, seja ao pensar,
seja ao falar ou escrever, está presente em cada um o que é hoje motivo
de profunda preocupação para o mundo, pois tudo se acha saturado
pela influência de tais circunstâncias.

Nestes momentos verdadeiramente cruciais na história do mundo,
fortes correntes mentais parecem levantar-se desse ou daquele ponto,
dando lugar ao que poderíamos chamar de “batalha das idéias” .
Tudo quanto está acontecendo é conseqüência de erros passados: erros
nos procedimentos, na conduta, nos pensamentos e nos atos de
cada indivíduo e de cada nação, e que se foram somando até que a fita
elástica da tolerância se rompeu, sobrevindo a catástrofe sofrida ultimamente.
Não obstante, a julgar pelos erros em que até hoje se incorre,
diríamos que a tremenda hecatombe que a humanidade suportou
não foi ainda suficiente para apaziguar os ânimos e fazê-los retomar
o caminho da concórdia, do trabalho e da paz.

A política, em sua ampla acepção de governo, de ordem, de discernimento
e justiça, poderia ter sido o eixo fundamental de todas as civilizações,
se os homens não a tivessem prostituído, fazendo dela a mãe
de todos os vícios. É precisamente por essa causa – a maior de todas as
causas, queira-se ou não – que a humanidade tem padecido tanto. É
por ela que vem suportando tantas injustiças e tem sangrado e vivido
amarguras e penúrias, cuja intensidade nunca foi superada.

Nenhum passo poderá ser dado no mundo em direção à conquista
plena da paz, se não for com base no aperfeiçoamento dos sistemas em
que se funda a existência da sociedade humana. É indubitável que
custará muito desarraigar os males que se entranharam na conduta
dos homens; entretanto, se uma grande parte deles se empenhasse em
consegui-lo, pouco a pouco cederiam as razões, caso existam, em que
se enquista a resistência à obra de reforma e aperfeiçoamento universal.

Os homens chegariam, assim, a compreender que não se deve
avançar em excesso no campo das ambições pessoais, nem no desenvolvimento
das possibilidades individuais, buscando exclusivamente o
benefício próprio, pois todo excesso dessa índole prejudica o semelhante
e traz, por conseguinte, uma justa reação em defesa das naturais aspirações
de cada um.

Sabe-se bem que o que ocorre no indivíduo se reproduz de forma exatamente
igual nos povos, como se ambos obedecessem a leis idênticas
que os obrigassem a realizar processos em que intervêm, de um mesmo
modo, fatores de consequência própria e de estranha origem. Daí
serem indivíduos e povos levados, em certas circunstâncias, não aonde
teriam preferido ir para sua felicidade, mas sim em direção contrária,
quer dizer, rumo à desdita.

Nos momentos atuais, tem-se suscitado, em âmbito quase que mundial,
uma dissidência na maneira de encarar a forma e o fundo das coisas,
e assim vemos que, enquanto por um lado se busca melhorar a
situação econômica, chamando os homens ao trabalho sob o lema da
produção, por outro tal situação é tornada pior pelos que se negam a
oferecer sua contribuição nesta hora crítica do mundo, na qual tanto
se reclama o concurso de todos os seres humanos e o máximo de esforço
dentro de suas possibilidades.

É possível que muito do que está acontecendo nesta época de transição
universal seja devido ao relaxamento da moral, no sentido de o homem
haver perdido a consciência de seus deveres, daqueles deveres que são e
devem ser – para ele, para a sociedade e para a humanidade inteira – leis
inevitáveis. A inconsciência a que se chegou em muitas partes do mundo
se revela no fato de se lesarem os direitos que o homem conquistou para
dignificar sua existência, e de se ultrajarem e danificarem os bens do sagrado
patrimônio do indivíduo, adquiridos à custa de sacrifícios, desvelos
e trabalho. Quando isso acontece, o espírito se desnutre e perde todo o
vigor de seus gloriosos e heróicos ciclos de pujança civilizadora.

É necessário chegar a compreender que as leis universais são in-
flexíveis, e que, ao infringi-las, é impossível evitar que se produzam tremendas
calamidades. Uma dessas leis é, precisamente, a que concerne a
tudo aquilo que diz respeito à existência humana e, muito especialmente,
à sua evolução, a seu progresso e a suas perspectivas de desenvolvimento
individual. O homem requer amplidão para o desenvolvimento
natural de suas idéias e atividades; amplidão que, sabemos, está
limitada pelas leis que regulam a sociedade da qual ele faz parte.

A inteligência e a vontade humanas são movidas e aguçadas pelo estímulo;
ambas são criadoras por excelência, e sua expansão depende
do grau de segurança no seu desenvolvimento. Porém, esse estímulo
que o homem necessita como fecunda irrigação para sua inteligência e
sua vontade não é, por certo, a sedutora prebenda que a alma nobre
despreza, mas sim o gozo pleno dos frutos de sua própria produção.

Esse, e não outro, é o grande estímulo pelo qual clama o homem, os
povos e a humanidade inteira; e, enquanto ele não se converter na
mais real de todas as realidades, não haverá paz verdadeira no mundo.

Carlos Bernardo González Pecotche  Coletânea da Revista Logosofia Tomo I