Após o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), autoridades do Sul de Minas Gerais e até da região de São João da Boa Vista iniciaram uma série de discussões sobre a segurança das barragens existentes em Poços de Caldas e em Caldas. As mais preocupantes estão em Caldas: duas minas antigas que acumulam milhares de toneladas de rejeitos radioativos.
A estrutura foi utilizada para a exploração de urânio e está desativada desde 1995. Mas, segundo vistoria feita em novembro do ano passado por técnicos da UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto), há riscos de rompimento devido a possíveis processos de erosão interna. Os técnicos da universidade atestaram que o sistema extravasor da barragem com parte dos rejeitos está seriamente comprometido e há infiltração, aumentando o risco de ruptura.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), a barragem contém material radioativo relativo à primeira mina de urânio do Brasil. “A exploração durou de 1982 a 1995, quando foi encerrada sob o argumento de que as atividades eram economicamente inviáveis. Mesmo após o fim da mineração, remanescem no local a cava da mina, contendo lama com resíduos radioativos, uma fábrica de beneficiamento de minério desativada, dezenas de equipamentos e a barragem com milhares de toneladas de rejeitos contendo urânio, tório e rádio”.
O MPF ainda aponta que após o encerramento das atividades de exploração de urânio em 1995, não foram adotadas providências concretas para o descomissionamento da barragem e para a recuperação ambiental pelos danos causados. Diante dessa situação, o MPF moveu uma ação civil pública em 2015 contra a INB (Indústrias Nucleares do Brasil), estatal de economia mista vinculada ao Ministério das Minas e Energia responsável pelas minas.
O vereador de São José do Rio Pardo, Rafael Kocian (REDE), levantou a discussão em uma sessão da Câmara, pois as barragens de Caldas estão localizadas nas Bacias Hidrográficas (CBH) dos Afluentes Mineiros dos Rios Mogi-Guaçu e Pardo. E um possível rompimento da estrutura poderia contaminar a água que abastecesse praticamente 90% de Rio Pardo.
“Vou oficiar o Ministério Público Federal, Estadual, Agência Nacional de Mineração e todos os órgãos necessários para saber qual a gravidade disso. Essa barreira de rejeitos é radioativa e está na Bacia do Rio Pardo e um possível rompimento poderia contaminar tudo”, disse Kocian, com preocupação.
O Ministério Público Federal informou ter recomendado à empresa Indústrias Nucleares do Brasil (INB) que adote providências necessárias para a implementação do Plano de Ação Emergencial (PAEMB) na barragem de sua unidade, situada em Caldas (MG). O documento cobra a implementação do PAEMB até dia 30 de março.
Estima-se que uma resolução definitiva para o problema desses rejeitos custaria US$ 500 milhões ao longo dos próximos 40 anos.
Geólogo tranquiliza população
O geólogo Hélio Scalvi, com 43 anos de experiência no assunto e atualmente morando em Poços de Caldas, já participou como observador da construção da barragem da INB e visitou muitas barragens, como as da Alcoa, Curimbaba, Phelps, entre outras.
Ele conta que a região do Sul de Minas concentra 15 mineradoras, localizadas nas cidades de Caldas, Nazareno, Guaranésia, Fortaleza de Minas, São Tiago e Passos. Poços de Caldas tem o maior número de barragens, com 18 ao todo.
Mas, segundo o geólogo, as barragens localizadas no Sul de Minas são infinitamente menores do que as barragens da região de Belo Horizonte e a quantidade de material que está ali disposto também é menor do que a de Brumadinho, por exemplo. Para ele, ainda que houvesse um rompimento, não haveria perigo.
Outra observação feita por Scalvi é que a forma como são construídas as barragens no Sul de Minas é diferente, com tecnologia avançada, com dreno em forma de flauta, que escoa toda a água do maciço, o que o torna muito mais seco do que as barragens da região de Mariana e Brumadinho.
Sobre as minas de Caldas, o geólogo explica que uma contém apenas água, que era utilizada no processo de produção do urânio. Já a outra possui os resíduos da produção de urânio e também os resíduos do tratamento da drenagem ácida, que são metais pesados e cal.
Scalvi, que trabalhou por 30 anos na INB, afirma que a estrutura das barragens é confiável, mas faz um alerta. “São necessários trabalhos de manutenção constante, monitoramento, fiscalização principalmente e uma maior abertura da empresa para que a sociedade saiba quais são os trabalhos técnicos que estão sendo desenvolvidos e quais são as medidas de segurança que a empresa vai implementar”.
O especialista deixa um alerta. “Nesse momento vão tentar achar culpados, resolver o problema da fiscalização em todas as barragens. Mas infelizmente não vão conseguir fazer nada, como não conseguiram após o desastre de Mariana. A sugestão que eu tenho é que a legislação mudasse e as empresas fossem obrigadas a contratar consultores independentes, que dessem laudos de seis em seis meses”.
Hélio Scalvi é formado em geologia pela Unesp em 1976, graduado em Direito e com especialização em Direito Ambiental pela PUC. Foi representante do Brasil durante seis anos em reuniões dos países produtores de urânio na Europa e na África do Sul. Atuou como gerente da Mina de Urânio do Planalto de Poços de Caldas. Atualmente é consultor nas áreas de geologia, meio ambiente e Direito Ambiental.
Moradores de Caldas estão assustados
Com a tragédia de Brumadinho, os moradores de Caldas ficaram preocupados e iniciaram um movimento para que o Poder Público olhe para o problema das barragens no município.
O MUNICÍPIO conversou com a Secretária de Meio Ambiente da Prefeitura de Caldas, Priscila Magne Bueno Yaegashi, a qual revelou que o prefeito da cidade montou uma comissão para acompanhar de perto a estrutura das barragens e uma obra que está sendo feita pela INB.
“Eles verificaram uma alteração no comportamento e terão que fazer um reparo no sistema extravasor, que é antigo. Mas, antes disso, eles estão fazendo uma obra auxiliar para garantir a segurança do local”, explica.
Priscila garante que a estrutura das minas de urânio de Caldas é bem diferente da de minério de ferro de Brumadinho e mais segura. No entanto, ela diz que não pode afirmar que são seguras e que não vão romper.
O MUNICIPIO questionou a secretária se há riscos para a população, em razão da presença do material radioativo nas minas, e Priscila afirma que não há um estudo nesse sentido. “Tem que ser feito um estudo sobre o rejeito radioativo para ver se ele é seguro, se tem 100% de neutralidade”.
A Secretária de Meio Ambiente revelou ainda que possíveis rompimentos das barragens não afetariam a cidade de Caldas. Uma delas atingiria Pocinhos do Rio Verde e a outra, a cidade de Poços de Caldas.
Por Reinaldo Benedetti.