Liberdade e livre arbítrio

Para a maioria das pessoas, ser livre é fazer aquilo que a cada um mais apeteça; se está bem ou malfeito, isso não é o que importa.

A liberdade se diferencia do livre-arbítrio pelo fato de que, enquanto a primeira tem sua expressão no mundo externo, o último a tem no interior do indivíduo.

A liberdade de culto, de palavra, de comércio, como a de caráter político, social ou econômico, são produtos de uma manifestação que transcende o foro interno do homem. Essa liberdade é requerida por uma necessidade lógica da convivência humana e é, ao mesmo tempo, imprescindível para que as faculdades do indivíduo encontrem campo mais propício para seu desenvolvimento e função. Condená-lo a suportar uma opressão que o prive de sua liberdade é submetê-lo a um virtual embrutecimento.

Pode um homem ser privado de sua liberdade, não lhe sendo permitido mover-se à vontade; porém, o livre-arbítrio continuará atuando internamente, já que ninguém poderá impedir a atividade dos pensamentos dentro de sua mente. Cervantes, por exemplo, quando concebeu e escreveu no cárcere a famosa obra em que sintetizou boa parte das observações que havia feito sobre a psicologia humana, deu uma prova evidente de que não havia sido privado do livre uso de suas faculdades mentais.

Não obstante, o livre-arbítrio, ou seja, o exercício da razão em correspondência direta com as demais faculdades do sistema mental, pode ser reduzido ao mínimo e até anulado, se o homem é privado, desde a infância, do livre jogo das funções de sua inteligência, sendo obrigado a fechar sua mente a toda reflexão útil.  Em consequência, sobrevém a atrofia de suas faculdades e o debilitamento da razão até ser anulada.

Dentro da estrutura das leis que gravitam sobre a consciência do indivíduo, a liberdade humana é a mais preciosa conquista.

O dilema é claro e terminante: ou se aceita o triunfo da barbárie, com os povos se confessando culpados de todas as agressões cometidas pela delinquência, ou se proclama o triunfo da civilização, que é o da sensatez, e se tomam todas as medidas para rechaçar o mal. Os dias futuros dirão se as páginas que a História reservou para a nossa época haverão de ser escritas por mandado da força ou se serão ditadas pela razão das consciências livres.

Extraído da Coletânea da Revista Logosofia, Tomo 2, pág. 7-9