O olhar para o texto

Meu olhar para o texto é rápido como navalha. Saco alguns pontos de vista da manga, muitos deles sobre o cotidiano, tentando alçar voo para fora do bueiro comum da rotina, enquanto vou sambando pela avenida literária com este pouco de poesia.
É questão de espaço, tempo e transpiração. A inspiração é consequência, porque conscientemente está o prazo de entrega e o limite de toques.
Escrever é bocada. Quanto mais se escreve, a falta de assunto torna-se presente, passando de falta de inspiração para motivação em escrever um texto.
Cobro-me muito da poesia na prosa, tento cobrir o texto de poucos caracteres com alguns confetes e Serafins, cultivo o olhar lírico, e muitas vezes, romântico, para as coisas simples da vida. Escritor é um mensageiro de esperanças. Toda ficção que se escreve, é sempre uma tentativa de busca de beleza, sobre a realidade.
Vida de escritor é como um sacerdócio samurai: louvar o que já foi; ser o melhor hoje do que ontem; e ser fiel a língua-mãe, pois ela é complicada de agradar. Somos eternos aprendizes e servidores a sua mercê, buscando cultivar nosso estilo sempre nos curvando diante suas regras e exceções como solícitos monges budistas.
O texto nunca é arquitetônico, pensado ou planejado: é um copia-e-cola eterno, verdadeiro patchwork no branco das páginas.
Depois de pronto, não contente, sou capaz de mudar tudo o que já fiz, desfaço, fito e releio tudo de ponta cabeça, de trás para frente. As vírgulas são as mais cortadas, cicatrizes textuais, indo ou retornando em outros parágrafos, em outras orações, em outros períodos.
A cobrança dos toques são os dragões a serem enfrentados diante do teclado por horas a fio, a procura do nosso melhor. Somos coletores dos melhores caracteres no mínimo de espaço possível, tarefa quase impossível de ser comprida, e por isso, tento sempre que possível cobrir meu texto em mil, mil oitocentos até os dois mil caracteres por lauda. Não há dedos nas teclas neste momento, só frenéticos sons no teclado. E apesar de tudo, nada se compara aos barulhos das antigas redações de jornais, vindo das frenéticas e mecânicas máquinas de escrever, objeto de estima a muitos colegas de ofício.
Hoje por quebra de protocolo, ultrapassei os 1000 caracteres típicos da segundona. Já estou ciente de que, tornar o texto o melhor possível, com alguns vocábulos a mais, vá me render alguns trocados a menos. Acho que estou pegando gosto pelo ofício de escrever.