A arte de ensinar e a vontade de aprender (Parte 1)

A arte de ensinar e a vontade de aprender (Parte 1)

O ser que já ultrapassou a época dos sonhos quiméricos, quando mostra ardente vontade de superação e em verdade quer desfrutar mais prontamente as prerrogativas que a ampliação do saber confere, deve se dispor, com todas as forças de sua alma, a levar adiante, com digno entusiasmo e empenho, a tarefa de cultivar suas faculdades. Convém, por conseguinte, se não existem sinais que a evidenciem, começar por criar a vocação para o estudo, para a ilustração e o aperfeiçoamento. Essa vocação pode ser com certeza criada, se, auscultando o sentir, percebe que surgem aspirações de melhoramento, a qual se há de querer transcender, distanciando-a cada dia mais das condições superiores cuja conquista se tenta.

 

Deve-se entender por vocação o pensamento que preside e
anima o esforço em tenaz correspondência com a vontade

que em nenhuma hipótese deve decair, uma vez definido e preparado o caminho a seguir. Ao mesmo tempo, deverá formar-se um juízo bem-acabado sobre as preferências internas a respeito do saber, ou seja, se tão-somente se busca este saber para adquirir uma certa ilustração ou se é erigido como uma necessidade permanente do espírito e como finalidade primordial da existência. Em tal caso, o ato de estudar e aprender transforma-se fundamentalmente: reveste-se agora de todas as características da fecundidade, no natural exercício da função criadora do pensamento.

No primeiro caso, o ser humano somente busca melhorar suas perspectivas, fazendo mais cômodo o lugar que ocupa na vida de relacionamento. Sabe-se como a ignorância, que é ausência de conhecimentos, limita e dificulta a maneira de viver e os meios de atuar, já que, não sabendo como ser mais, o inapto haverá de se conformar com aquilo que licitamente e por justiça lhe é possível ter. Porém, melhoradas suas condições pela instrução e pelo esforço na sua aplicação, é lógico que experimente o prazer inefável de seu adiantamento espiritual e material. Entenda-se espiritual porque é coisa muito certa que toda claridade que se consiga fazer penetrar na mente sempre tende a repercutir no sentimento, e este, por reflexo, atrai o espírito e, em consequência, a atenção para o que surge acima do material, enobrecendo a vida.

Quando se cultiva o saber simplesmente por cultivar, para satisfazer uma vaidade enquanto se permanece totalmente alheio à realidade e à força viva do conhecimento, o ser pode conseguir uma vasta ilustração e até chegar a colocar-se entre os que se destacam nas letras, nas artes, na política, nas finanças e em todos aqueles ramos do saber comum em que se elogia e se enaltece a personalidade. Isto, porém, não evita que ele sinta muitas vezes uma nostalgia indefinida, um vazio interno que não se consegue preencher com nada e que é resultado de tudo quanto foi construído sem objetivos perduráveis. Isso ocorre com aqueles que se esquecem de que a vida tem outro conteúdo, onde reside o porquê da existência.

Para conhecer esse conteúdo, é necessário internar-se em si mesmo tanto quanto o permita a própria evolução. Foram muitos os que em todos os tempos empreenderam esta tarefa, em sua maior parte levados pela crença de poderem desentranhar num curto prazo os mistérios que se ocultam nas profundezas da criação humana. A imensa maioria voltou dessa incursão, malogradas as esperanças e quebrantados os esforços, trazendo como saldo a decepção e o desconsolo. Tal é a consequência das investigações infrutíferas, pois se desconhece a forma de realizar tão magna empresa e não se leva em conta, sobretudo, que os principais fatores que contribuem para seu êxito devem ser encontrados nos umbrais da própria vida, ali onde nasce tudo que cada ser possui de verdadeiro e puro.

Extraído da Coleção da Revista Logosofia, tomo 2, pág 163.