Mostruário de cultura inútil 02

– José de Alencar, de Iracema, o maior romancista brasileiro do século XIX, foi dos poucos inimigos declarados do imperador Pedro II. Apesar de ter sido ministro da Justiça, foi preterido numa lista tríplice da qual o soberano nomearia um senador, então cargo vitalício de livre escolha e não eletivo. “Sujeitinho desaforado!” – assim se referiu D. Pedro a Alencar.

– Lusíadas quer dizer canto de louvor aos lusos. A grandiosa obra de Luís Vaz de Camões (1572) tem 8.816 versos decassílabos, distribuídos em 10 cantos, como se fossem capítulos. Os cantos são divididos em 1.102  estanças, como se fossem parágrafos. Cada estança tem 8 versos de 10 sílabas métricas cada um. Rimam entre si os versos 1,3 e 5; os versos 2,4 e 6; os versos 7 e 8.  Fácil, não?

– Machado de Assis nasceu, viveu e morreu no Rio de Janeiro. Só fez uma viagem na vida: com problemas de visão, foi a Nova Friburgo (uns 200 quilômetros distante), onde ditou à mulher Carolina os capítulos iniciais de Memórias Póstumas de Brás Cubas, romance que inaugura sua melhor fase, a do realismo psicológico.

– Monteiro Lobato, que conheceu a prisão durante a ditadura de Getúlio Vargas, assim comentou o ingresso do político na Academia Brasileira de Letras:  “ Ela tem 40 membros. Getúlio será o ZERO desse número”.

– Muitos escritores de reconhecido valor jamais admitiram ser candidatos à Academia Brasileira de Letras, para não terem de cumprir o rígido ritual, que exige o pedido formal e individual de votos a cada acadêmico.

– Nascido em Itabira do Mato Dentro (MG), Carlos Drummond de Andrade, por muitos considerado o grande poeta moderno do Brasil, durante bastante tempo foi  tido como  persona non grata em sua cidade natal. Tudo por causa destes versos finais do poema “Confidências de um itabirano”: Itabira é apenas um retrato na parede. Mas como dói!

– No verso camoniano  “Nos saudosos campos do Mondego”, do episódio de Inês de Castro em Os Lusíadas, para serem apuradas as dez sílabas métricas constantes em toda a vasta obra, a palavra saudosos precisa ser lida como tendo quatro sílabas: sa-u-do-sos, em que o ditongo au se torna o hiato a-u. Isso se chama “licença poética”,  ou em latim: poetis et  pictoribus omnia licet, –  aos poetas e pintores tudo é permitido.

– O grande poeta Manuel Bandeira se  ralava de inveja (palavras suas) de um verso de Orestes Barbosa, autor da letra de “Chão de estrelas”, clássico da música popular brasileira: Tu pisavas nos astros, distraída.

– Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, o nome completo do autor de belos sonetos e do poemeto épico “O caçador   de esmeraldas”, forma um verso alexandrino perfeito, até com a sexta sílaba forte, como manda a regra. Um predestinado, portanto.

– Quando você reclama da homilia de quase meia hora de um padre qualquer, sempre é bom saber que alguns sermões do maior orador sacro da língua portuguesa, o jesuíta Antônio Vieira (1608 – 1697), beiravam duas horas de duração. É o caso do talvez mais famoso deles, o sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda.